Kenneth L. Gentry, Jr.
Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto1
Um dos assuntos mais familiares em discussões sobre a escatologia cristã é o reino milenar de Cristo mencionado por João em Apocalipse 10:1-6. A palavra “milênio” é baseada na tradução latina da frase “mil anos”, que é encontrada seis vezes em seis versículos. De fato, essa breve passagem nos fornece a fraseologia descritiva que diferencia as três escolas evangélicas básicas de escatologia bíblica: pré-milenismo, amilenismo e pós-milenismo.O imensamente popular ramo dispensacionalista do pré-milenismo está solidamente enraizado em Apocalipse 20. De fato, os dispensacionalistas consideram o entendimento literal dessa passagem como a prova positiva do seu pré-milenismo, enquanto as posições amilenista e pós-milenista ensinam que os 1.000 anos é um período simbólico de tempo, e não 365.000 dias literais. Mas a abordagem dispensacionalista de Apocalipse 20 é apropriada? Se não, como
deveríamos interpretar essa importante passagem?
Dificuldades do Literalismo
A despeito da convicção dispensacionalista predominante de que devemos abordar Apocalipse 20 de uma forma diretamente literal, essa abordagem é fundamentalmente defeituosa. Primeiro, Apocalipse é um livro de símbolos. Em Apocalipse 1:1 João começa declarando que o livro foi “enviado e notificado”. Até mesmo o dispensacionalista John Walvoord admite que isso fala de “revelações através de símbolos, como neste livro”. Em outro lugar ele escreve: “A literatura apocalíptica pertence à classe única, porque todos concordam que ela não é, estritamente falando, literal em sua interpretação. Exemplos notáveis, é claro, são os livros de Daniel, Ezequiel e Apocalipse”. Consequentemente, o reinado de 1.000 anos de Cristo poderia muito bem ser um período de tempo simbólico. Segundo, João fornece pistas demonstrando a natureza simbólica das suas profecias. As sete “estrelas” não são estrelas, mas anjos (Ap. 1:20). Os sete “candeeiros” retratam as igrejas (1:20). Os sete “olhos” sobre o Cordeiro são na verdade “sete espíritos” (5:6). As taças de “incenso” representam as orações (5:8). O “dragão” é Satanás (12:9). As sete “cabeças” da besta são montes e reis (17:9-10). Os dez “chifres” da besta simbolizam reis (17:2). E as “águas” significam povos (17:15). Ele nos fornece somente uns poucos exemplos do seu método simbólico, mas estes abrem o claro prospecto de características imbólicas adicionais – incluindo a possibilidade de Apocalipse 20 ser simbólico. Terceiro, muitos elementos do livro resistem absolutamente a uma interpretação literal. De fato, se abordarmos literalmente esses elementos erminaremos em absurdos embaraçosos. Encontramos criaturas estranhas cheias de olhos (Ap. 4:6)? Um cordeiro morto, mas vivo, com sete olhos (5:6)?
Quatro cavaleiros causando destruições (6:1-8)? Homens falando com montes (6:16)? Pessoas com roupas lavadas no sangue para torná-las brancas (7:14)? Gafanhotos com rosto de homem, dentes de leão, coroas de ouro e caudas como de escorpiões (9:6)? Cavalos com cabeça de leão, que soltam fogo, fumaça e enxofre pela boca (9:17)? Encontramos profetas que soltam fogo pela boca (11:5)? Um dragão
vermelho com dez chifres e sete diademas, que derruba estrelas do céu (12:3-4)? Uma mulher com asas de águia (12:14)? Uma serpente vomitando um rio de água da sua boca (12:15)? Uma besta com sete cabeças e muitos diademas, que é uma combinação de quatro animais (13:2)? Uma besta com dois chifres que força os homens à adoração idólatra (13:11)? Um anjo com uma foice para ceifar a terra (14:15)? Rãs saindo da boca de um dragão (16:13)? Uma prostituta cavalgando uma besta com sete cabeças e que está embriagada com sangue
(17:6)? Cristo retornando do céu com uma espada em sua boca e montado num cavalo (19:15)? Uma cidade que é um cubo de 1.500 milhas de altura e flutua no céu (21:10, 16)? Uma árvore que tem doze frutos diferentes (22:2)?
Que exegeta respeitável interpretaria essas coisas literalmente?
Novamente, talvez os 1.000 anos seja outra característica simbólica de Apocalipse. Dificuldades em Apocalipse 20 .Várias outras questões complicam a análise pré-milenista do próprio apocalipse 20, das quais temos espaço para mencionar apenas algumas. Primeiro, por que um conceito tão importante como o reino de 1.000 anos de Cristo é encontrado apenas em um livro em toda a Escritura? E somente
em um capítulo desse livro? De fato, apenas nos seis primeiros versículos desse capítulo? Afinal de contas, o “milênio” controla as três visões evangélicas básicas. Todavia, este período de tempo aparece somente em Apocalipse 20. Por que não lemos dos “mil anos” nas passagens importantes de Paulo sobre o retorno e o reino de Cristo: 1 Coríntios 15:20-58; Romanos 11:1-26; 1 Tessalonicenses 4:13-18? Ou no ensino do próprio Jesus sobre o reino, como nas Parábolas do Reino em Mateus 13 e na última parte do Discurso do Monte da Oliveira em Mateus 25:31-46? Ou em algum outro lugar na Escritura? Por que ele aparece somente no livro mais simbólico de toda a Bíblia? Segundo, por que deveríamos esperar que a quantidade numérica perfeitamente arredondada (1.000) deva ser entendida literalmente? Especialmente visto que ela é mencionada somente neste livro altamente simbólico? Estamos prontos a crer que Deus é dono apenas de 1.000 colinas (Sl. 50:10)? Que o Senhor promete que Israel seria apenas mil vezes mais numeroso (Dt. 1:11)? Ou que o amor de Deus é limitado a apenas 1.000 gerações (Dt. 7:9)? Ou que estar nos átrios de Deus valem mais apenas que 1.000 dias (Sl. 84:10)?Ou que Deus experimenta 1.000 anos como um dia e, portanto, 4.000 mil anos devem ser a experiência de quatro dias, e assim por diante (Sl. 90:4; 2Pe. 3:8)? Terceiro, Satanás, o anjo caído, será amarrado com uma corrente literal e colocado num abismo literal (Ap. 20:1-3)? De que essa corrente é feita? Quarto, como devemos tratar com as contradições do dispensacionalismo na passagem? Onde o “arrebatamento” pré-milenista e pré-tribulacionista é mencionado? O que dizer das duas ressurreições? A “primeira ressurreição” está fora de ordem no sistema dispensacionalista, visto que eles esperam que ela ocorra sete anos antes do milênio, enquanto Apocalipse 20:4 a vincula ao início do milênio. No sistema dispensacionalista, quando será a ressurreição dos santos convertidos durante a tribulação (por exemplo, 7:14); após a primeira ressurreição do dispensacionalismo? Quinto, estamos dispostos a aceitar uma segunda humilhação de Cristo baseado numa leitura literal dessa passagem? Esperamos realmente que o Cristo exaltado (Ef. 1:19-23; Fp. 2:9-11; Hb. 1:13; 1Pe. 3:22) retorne à terra para um reinado de 1.000 anos, somente para que seu reino, administrado pessoalmente por ele, se revolte contra ele e o cerque em Jerusalém (Ap. 20:7-9)?
Observações Pós-Milenistas
O que o pós-milenista faz com Apocalipse 20, então? Os 1.000 anos parecem funcionar como um valor simbólico, não estritamente limitado a um período literal de mil anos. Mil é o cubo de dez (10x10x10); dez é um número de perfeição quantitativa (aparentemente porque ele é o complemento de dedos
dos pés ou das mãos de uma pessoa). Os “mil anos”, então, servem como uma descrição simbólica de João da glória perpétua do reino que Cristo estabeleceu em sua primeira vinda. Em Apocalipse 20:1-3, João apresenta as implicações negativas do triunfo de Cristo sobre Satanás, quando “o dragão, a antiga serpente, que é o diabo, ou Satanás” (v. 2) é espiritualmente preso [grego: deo]. Esse aprisionamento restringe-o de realizar com sucesso seus maus desígnios na história. O anjo do céu que o prende evidentemente é o próprio Cristo, visto que: (1) A luta dos séculos é , no final das contas, entre Satanás e Cristo (Gn. 3:15; Mt. 4:1-11; João 12:31-32; Atos 26:15-18), tornando mais apropriado Cristo prender Satanás. (2) Cristo aparece sob imagem angélica em outros lugares no Apocalipse (compare Rev. 10:1 com 1:13-15). Além do mais, Mateus 12:28-29 nos informa da prisão de Satanás por Cristo durante seu ministério terreno: “Se, porém, eu expulso demônios pelo Espírito de Deus, certamente é chegado o reino de Deus sobre vós. Ou como pode alguém entrar na casa do valente e roubar-lhe os bens sem primeiro amarrá-lo [grego: deo, mesmo termo usado em Ap. 20:2]? E, então, lhe saqueará a casa” (Mt. 12:28-29). Isso faz paralelo ao pensamento de Apocalipse 20:1-6. Cristo realizou a prisão de Satanás judicialmente no primeiro século. Essa prisão não resulta na total inatividade de Satanás; antes, ela restringe seu poder pelo poder superior de Cristo. O contexto qualifica especialmente o propósito da prisão: é “para que” (grego: hina) Satanás “não mais enganasse as nações”. Antes da vinda de Cristo, todas as nações além dos limites de Israel estavam sob o domínio de Satanás (2 Reis 17:29; Lucas 4:6; Atos 26:17-18). Somente Israel, de todos os povos da terra, era um oásis num mundo árido pelo pecado; somente eles conheciam o Deus verdadeiro e a salvação (Sl. 147:19-20; Amós 3:2). Mas com a vinda de Cristo e a difusão do “evangelho do reino” ((Mt. 24:14; compare. Mt. 4:17, 23; Marcos 10:25, 29; Lucas 9:2, 6), além dos limites de Israel (Mt. 28:19; Atos 1:8; 13:47; 26:20), Satanás começou a perder seu domínio sobre os gentios. Em Apocalipse 20:4-6 vemos as implicações positivas do reino de Cristo. Enquanto Satanás está preso, Cristo reina e seu povo redimido participa com ele nesse reinado (Ap. 20:4). Esses participantes incluem tanto vivos como mortos:
os santos mártires no céu (“os decapitados por causa do testemunho de Jesus, bem como por causa da palavra de Deus”) e os santos perseverantes na terra (“e aqueles que [grego: oitines] não adoraram a besta”) (NASB). O governo do reino de Cristo envolve todos aqueles que sofrem por ele e entram no céu, bem como aqueles que vivem para ele durante sua jornada terrena. A “primeira ressurreição” refere-se à ressurreição espiritual daqueles nascidos de novo pela graça de Deus: “Nós sabemos que já passamos da morte para a vida, porque amamos os irmãos; aquele que não ama permanece na morte” (1 João 3:14). “Mas Deus, sendo rico em misericórdia, por causa do grande amor com que nos amou, e estando nós mortos em nossos delitos, nos deu vida juntamente com Cristo, — pela graça sois salvos, e, juntamente com
ele, nos ressuscitou, e nos fez assentar nos lugares celestiais em Cristo Jesus”(Ef. 2:4-6; compare Cl. 2:13).
De fato, em seu Evangelho o autor de Apocalipse faz um paralelo entre a ressurreição espiritual da salvação e a ressurreição física da escatologia, assim como ele o fez em Apocalipse 20: “Em verdade, em verdade vos digo: quem ouve a minha palavra e crê naquele que me enviou tem a vida eterna, não entra em juízo, mas passou da morte para a vida. Em verdade, em verdade vos digo que vem a hora e já chegou, em que os mortos ouvirão a voz do Filho de Deus; e os que a ouvirem viverão. Porque assim como o Pai tem vida em si mesmo, também concedeu ao Filho ter vida em si mesmo. E lhe deu autoridade para julgar, porque é o Filho do Homem. Não vos maravilheis disto, porque vem a hora em que todos os que se acham nos túmulos ouvirão a sua voz e sairão: os que tiverem feito o bem, para a ressurreição da vida; e os que tiverem praticado o mal, para a ressurreição do juízo” (João 5:24-29). Tendo sido espiritualmente ressuscitados, os santos (quer no céu ou na terra) são espiritualmente entronizados. Apocalipse 20:4-6 fala dos santos vivendo e reinando com Cristo, que em outro lugar refere-se à realidade espiritual na experiência presente do povo de Deus: “[Deus], juntamente com ele [Cristo], nos ressuscitou, e nos fez assentar nos lugares celestiais em Cristo Jesus” (Ef. 2:6; compare 1Co. 3:21-22; Cl. 3:1-2). Esse é um reino redentivo no qual, João informa sua audiência geral logo no início de Apocalipse, Cristo já “nos constituiu reino, sacerdotes para o seu Deus e Pai” (Ap. 1:6). Pedro diz aos cristãos do primeiro século (e a nós): “Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz” (1Pe. 2:9). Essas observações fazem paralelo a Apocalipse 20:6. Assim, o reinado dos santos “com Cristo” sobre tronos, enquanto Satanás está preso, retratam belamente seu reino redentivo já estabelecido: Cristo traz seu reino ao mundo para batalhar contra Satanás durante seu ministério terreno (Mt. 4:1-11; 12:28-29); Deus formalmente concede-lhe autoridade real em sua ressurreição/ascensão (Mt. 28:18; Rm. 1:4); e Cristo promete crescimento contínuo na história, até o fim (Mt. 13:31-33; 1Co. 15:25). O Rei dos reis, possuindo toda autoridade, comissiona seus servos a trazerem pessoas ao seu reino, prometendo-lhes estar com eles durante todo o tempo e abençoá-los em seu labor (Mt. 28:18-20; Fp. 4:13). Os cristãos são vencedores” (compare 1 João 2:13-14; 4:4; 5:4-5) e estão assentados com Cristo, o qual governa
presentemente: “Ao vencedor, dar-lhe-ei sentar-se comigo no meu trono, assim como também eu venci e me sentei com meu Pai no seu trono” (Ap. 3:21). A era “milenar” já dura quase 2.000 anos; ela pode continuar outros 1.000 ou 10.000. Os “restantes dos [espiritualmente] mortos” não participam nessa ressurreição espiritual. De fato, eles não revivem “até que se completassem os mil anos” (Ap. 20:5). Naquele tempo, eles serão fisicamente ressuscitados (implicado), para ficarem sujeitos à “segunda morte” (morte eterna), a qual lhes é trazida no juízo final (Ap. 20:11-15). Naquele tempo, certamente, Deus ressuscitará todos os homens fisicamente (Jó 19:23-27; Is. 26:19; João 5:28-29; Atos 24:15; Rm. 8:11, 23; Fp. 3:20; 1Ts. 4:16). Assim, então, a passagem fundacional do pré-milenismo falha em apoiar sua estrutura teológica. Sua abordagem de Apocalipse 20 foi posta na balança e achada em falta.
Sobre o autor: Kenneth L. Gentry tem vários títulos em teologia, incluindo um Th.D. do Seminário Whitefield. Ele é pastor da Igreja
Presbiteriana de Reedy River, em Conestee, Carolina do Sul, e escreveu
vários livros e inúmeros ensaios.
Artigo extraído e traduzido do site do autor, com permissão:
http://www.kennethgentry.com/
a grizeuda descobriu o segredo de teresa cristina
ResponderExcluiro quise busca quisinho na escola e teodora aparase para dar presente e quise nao deicha
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